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Artigo – Série: Terminologias notariais e registrais – Parte II – Digam ao povo que o nome certo é notário ou registrador
03 DE MAIO DE 2023
Digam ao povo que o nome certo é notário ou registrado
O texto do art. 3º da lei 8.935/1994 (Estatuto dos Notários e Registradores) é uníssono ao estabelecer o nomen iuris dos profissionais do direito que recebem a delegação pública para exercer a função notarial e registral: Notários, ou Tabeliães (para aqueles que exercerão função no TN e/ou no TP) e Registradores, ou Oficiais de Registro (para os que exercerão função no RI, RTD, RCPN ou RCPJ).[1]
Mesmo a legislação sendo tão clara, a ponto de explicar até como esses profissionais do direito devem ser chamados, ainda existe uma dificuldade da população e, por vezes, dos próprios Tribunais, em chamar pelo nome previsto na lei.
No início do ano de 1822, Dom Pedro I, ao proferir a mitológica frase “Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, digam ao povo que fico!”, inaugurou o que viria a ser quase que uma tradição brasileira, uma questão folclórica. Na época provavelmente ele não sabia disso… e talvez muita gente nem percebeu esse jeitinho brasileiro de dizer as coisas… mas, de lá para cá, as autoridades de nosso País mais “mandam dizer” do que “dizem diretamente”. Então, “Digam ao povo que o nome certo é Notário ou Registrador!”.
O dono do “cartório” todo
Pesquisei na legislação brasileira e confesso que não encontrei em lugar algum a função “dono de cartório”.
Aliás, sendo uma delegação pública, o Estado delega determinada autoridade, mas a titularidade nunca deixa de ser do Estado. Outrossim, embora o Notário e o Registrador atuem em caráter privado (muito semelhante com o que ocorre com as empresas), a natureza de sua atuação é de função pública. Logo, eles (Notários e Registradores) não são “donos do cartório”, apenas possuem uma delegação estatal para que, enquanto capazes, possam exercer sua função pública.
Os profissionais à frente dos cartórios não são, pois, “donos” destes, mas sim exercentes da função pública de Tabeliães e Oficiais de Registro, vez que – repise-se – recebem uma delegação de serviço público, em virtude de aprovação em concurso público de provas e títulos.
O acervo do cartório, físico e eletrônico, é propriedade do Estado (verdadeiro “dono”), ficando meramente sob guarda e conservação do Notário e/ou Registrador enquanto vigente a sua delegação, devendo ser devolvido ao Estado quando da vacância da função, para que seja delegado a novo Notário e/ou Registrador.
Cabe aos Notários e Registradores evitar, a todo custo, o uso da expressão “dono de cartório” – corrigindo se for necessário -, como forma de educar a sociedade.
“Agente delegado” é quem trabalha para o FBI?
Outra referência errônea é chamar indiscriminadamente o Notário e o Registrador como “agente delegado”. É certo que, no âmbito do Direito Administrativo, dentre os agentes públicos, algumas classificações enquadram estes profissionais do direito na modalidade de “agentes delegados”, mas também enquadram Juízes e Promotores como “agentes políticos” e nem por isso mandamos ofícios aos “Excelentíssimos Agentes Políticos”.
Primeiramente, cabe destacar que os Notários e Registradores se enquadram no amplo conceito de “agentes públicos”. Como é cediço, dentro deste conceito há certas subdivisões, as quais importam para estabelecer diferentes espécies de agentes públicos, visando enquadrar estas em seus respectivos regimes jurídicos e, assim, sistematizar os regramentos específicos afetos a cada uma destas espécies.
Em proposta clássica, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO classifica os agentes públicos em “a) agentes políticos; b) servidores estatais, abrangendo servidores públicos e servidores das pessoas governamentais de direito privado; e c) particulares em atuação colaboradora com o Poder Público”.[2]
Outra proposta de classificação pode ser extraída das valiosas lições de HELY LOPES MEIRELLES, o qual classifica os agentes públicos em cinco grandes grupos: “agentes políticos, agentes administrativos, agentes honoríficos, agentes delegados e agentes credenciados”.[3]
A depender da classificação adotada, a doutrina qualifica os Notários e Registradores como…
… particulares em colaboração com o poder público:
Nada obstante, os sujeitos titulados pela delegação em apreço [Notários e Registradores] conservam a qualidade de particulares (investidos em poderes públicos) visto que a exercerão em caráter privado; donde, não recebem dos cofres públicos, não operam em próprios do Estado nem com recursos materiais por ele fornecidos. A Constituição Federal, no art. 236, não engendrou qualquer novidade na configuração da relação estatal entre notários e registradores. Unicamente declarou-a às expressas. Segue-se que não há como ou porque extrair dele ou da lei que o regulamentou pretensas mudanças de sistemática e imaginárias transformações radicais em relação ao sistema precedente.[4]
… ou, agentes delegados:
Os Notários [e Registradores] enquadrados no art. 236, em virtude de atuarem em caráter privado, não integram sequer a estrutura do Estado. Atuam em recinto particular, contando com os serviços de pessoas que também não tem qualidade de servidor e que auferem salário em face de relação jurídica que os aproxima, regida não pela lei disciplinadora do regime jurídico único, mas pela Consolidação das Leis do Trabalho. Sim, os empregados do Cartório, do notário dele titular, tais como este, nada recebem dos cofres públicos, não passando pela cabeça de ninguém os enquadrar, mesmo assim, como servidores e atribuir-lhes os direitos inerentes a esse status. […] São agentes delegados que recebem a incumbência da execução de determinada atividade ou serviço público e o realizam em nome próprio por sua conta e risco, mas segundo as normas do Estado e permanente fiscalização do agente.[5]
Respondendo à pergunta que dá nome a este capítulo: por óbvio que agentes delegados não trabalham para o FBI, mas a nomenclatura também não designa tão somente Notários e Registradores, de modo que ela não deve ser utilizada como forma de identificação da função notarial e registral, haja vista que é bem mais ampla.[6]
A doutrina especializada classifica os particulares em colaboração com o Poder Público, ou agentes delegados, do seguinte modo: a) requisitados ou convocados (p. ex., mesários, jurados, conscritos); b) voluntários, honoríficos ou sponte propria (p. ex., dirigentes de conselhos, médicos voluntários); c) concessionários e permissionários de serviço público (p. ex., empresas que firmam contratos de prestação de serviço público com o Estado) e; d) delegatários de serviço público (notadamente os Notários e Registradores).[7]
Como percebemos, não se trata de classificação que engloba apenas os Notários e Registradores, os quais tem dois nomes legais (previstos no art. 3º da lei 8.935/1994), cada um para identificar sua função.
Então, senhores, assim como Juiz, ou Magistrado, é espécie – e não sinônimo – de agentes políticos; Notários, ou Tabeliães, e Registradores, ou Oficiais de Registro, são espécie – e não sinônimo – de agentes delegados. Logo, não é correto discriminar como agentes delegados os Notários e Registradores, vez que a expressão não remete exatamente à sua função.[8]
E “delegatário”. Pode?
Não há dúvida que os Notários e Registradores são “delegatários de serviço público”, haja vista que “Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público” (art. 236, caput, CF). Ademais, dentre a classificação do Direito Administrativo, dos agentes delegados, vimos que se inserem na submodalidade de delegatários.
Mas então, porque não chamar assim os Notários e Registradores?
Bem, primeiramente porque o nome dado por lei é – repise-se, para fixarmos mais um pouquinho! – Notário ou Tabelião e Registrador ou Oficial de Registro.
Outro fato a impor a não utilização do termo delegatário (embora tenha a vantagem de englobar as duas funções) é que a expressão diz respeito à forma pela qual é outorgado o serviço público e não o efetivo ofício exercido. Seria o mesmo que chamar os demais agentes públicos de nomeados, já que essa é a forma de provimento da maioria dos demais agentes públicos brasileiros, seja por ingresso efetivo por concurso público, seja por eleição, seja por designação em confiança.
Entende? Delegatário, assim como nomeado, não diz nada ao cidadão. Não identifica, não dá uma cara à profissão, não caracteriza a função exercida.
Outro inconveniente, talvez não tão percebido pelos titulares de delegações notariais e registrais (rectius: Notários e Registradores), é que a expressão delegatários é usual pelas Corregedorias de Justiça, muito mais no âmbito de atividades correcionais, procedimentos administrativos disciplinares e sindicâncias.
Não se trata de uma nomenclatura utilizada pelo público em geral e, por esse motivo, não ajuda na identificação e na divulgação positiva da atividade notarial e registral.
Por isso, pode me chamar de “Notário ou Tabelião”, “Registrador ou Oficial de Registro”. É isso, obrigado!
O conto do “Escrivão” e da “Escrivona”
Nesses rincões brasileiros, não raro é a dificuldade da população em designar pelo nome correto a profissão dos Notários e Registradores. Muitas vezes estes são confundidos com “escrivães” ou “escrivãs” (ou o designativo feminino “carinhoso”, mas errado e também comum: “escrivona”).
A confusão dos termos “Notários e Registradores” com “Escrivães” não é por acaso, precisamos lembrar que se defere aos escribanos do Antigo Egito as primeiras notas e registros. Aliás, essa nomenclatura ainda é utilizada em diversos países de língua latina, especialmente espanhola.
Outrossim, em Portugal e, durante o período do Brasil-Colônia, existia uma atuação conjunta entre a função de Tabelião de Notas e do Judicial, posteriormente separada, transferindo essa última função aos “Escrivães Judiciais”, existentes até os dias de hoje na 1ª instância da Justiça Estadual e da Justiça Eleitoral.[9-10]
Reforça o problema da dificuldade de padronização de nomenclaturas a contínua utilização em alguns estados da Federação, como ocorre em Santa Catarina, em que o Tabelião de Notas e Registrador Civil é chamado – contrariamente ao que estabelece a legislação federal, competente para dispor sobre registros públicos, conforme art. 22, inc. XXV, da CF – de “Escrivão de Paz”. O que, de fato, só dificulta na padronização das nomenclaturas notariais e registrais.
Por óbvio, a profissão de Escrivão e a profissão de Notário e Registrador são bastante diferentes e não guardam atualmente nenhuma relação prática, sendo certo designar os delegatários dos serviços notariais e registrais apenas por estes últimos vocábulos: Notário ou Tabelião e Registrador ou Oficial de Registro.
Existe “Oficiala”?
Quando o assunto é designar o substantivo feminino de alguma profissão, existem situações em que o substantivo concorda com o gênero, incluindo, normalmente, o artigo “a” ao final da palavra, por exemplo. Porém, existem situações em que o substantivo é comum-de-dois-gêneros, permanecendo inalterado, sendo que os artigos definidos “o” ou “a”, a frente da palavra, tem a função de designar o respectivo gênero.
É, pois, o caso do debate gramatical acerca da correta grafia da palavra designativa da profissão de “Oficial”, em sua versão feminina.
Para explicar melhor o assunto, vamos nos valer da explicação formulada pelo abalizado conhecimento do jurista e professor em língua portuguesa, Dr. JOSÉ MARIA DA COSTA:[11]
1) Assim como o feminino de juiz de direito é juíza de direito, não há, em tese, razão alguma para se estranhar que, se a função de oficial de justiça é desempenhada por uma mulher, será ela uma oficiala de justiça, a exemplo de consulesa, coronela, delegada, deputada, generala, marechala, ministra, paraninfa, prefeita, primeira-ministra, sargenta, vereadora.
2) Acrescente-se, por oportuno, que o feminino oficiala é assim apontado, sem outras observações, ressalvas ou reservas, por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira.[12]
3) Também Napoleão Mendes de Almeida, de modo categórico, assevera que esse sempre há de ser o feminino.[13]
4) Em mesma esteira, posta-se Evanildo Bechara.[14]
5) Domingos Paschoal Cegalla, sem outros comentários ou ressalvas, dá oficiala como o único “feminino de oficial: oficiala de modista, oficiala da Marinha”.[15]
6) Cândido de Oliveira, após observar que, até há pouco, a maioria de nomes dessa natureza era considerada comum de dois gêneros, acrescenta textualmente que “é de lei, assim para o funcionalismo federal como estadual, e de acordo com o bom senso gramatical, que nomes designativos de cargos e funções tenham flexão: uma forma para o masculino, outra para o feminino”; e, em seu exemplário, ao masculino oficial contrapõe ele o feminino oficiala.[16]
7) Silveira Bueno, por um lado, traz antigo ensinamento de J. Silva Correia, diretor da Faculdade de Letras de Lisboa: “Nos últimos tempos têm surgido numerosas formas femininas, que a língua de épocas não distantes desconhecia, – e que são como que o reflexo filológico do progresso masculinístico da mulher, – hoje com franco acesso a carreiras liberais, donde outrora era sistematicamente excluída”.
8) Por outro lado, também aduz tal autor curiosa lição de Lebierre: “Os gramáticos preceituam que os substantivos designativos de certas profissões, a maior parte das vezes exercidas por homens, conservem a forma masculina para a maioria de tais substantivos”.
9) E conclui ele próprio: “Os gramáticos, que defenderam a conservação, no masculino, dos nomes de cargos outrora exercidos por homens e já agora também por senhoras, não tinham razão porque tais nomes são meros adjetivos como escriturário, secretário, deputado, senador, prefeito, podendo concordar com o sexo da pessoa que tal cargo exerce e não com o gênero dos nomes de tais profissões”.
10) E preconiza ele que se diga oficiala, se tal posto é entregue a uma senhora, acrescentando que Camilo Castelo Branco emprega tal forma para designar a costureira de modista.[17]
11) Para que se avaliem as profundas alterações em tempo exíguo acerca da ascensão profissional da mulher, com a consequente necessidade de emprego de novos vocábulos, basta que se veja que, mesmo na segunda metade do século XX, ainda lecionava Artur de Almeida Torres haver “certos femininos que são meramente teóricos, e cujo conhecimento não oferece nenhuma utilidade prática”, acrescentando tal autor que “esses femininos só servem para sobrecarregar inutilmente a memória do estudante”.
12) E, dentre tais substantivos inúteis, elenca ele, por exemplo, capitoa (de capitão), aviatriz (de aviador) e anfitrioa (de anfitrião).[18]
13) Cândido Jucá Filho, por sua vez, muito embora sem indicar preferência nem prestar outros esclarecimentos, ressalta que o uso de oficiala às vezes é irônico.[19]
14) Édison de Oliveira insere tal palavra entre aqueles diversos vocábulos femininos terminados por a, que o povo evita usar, “quer em virtude de preconceito de que se trata de funções ou características próprias do homem, quer por considerá-los mal sonoros ou exóticos”, acrescentando, ademais, que se hão de empregar tais femininos, “que a gramática já ratificou definitivamente”.[20]
15) Geraldo Amaral Arruda, por sua vez, inclui o mencionado substantivo entre os comuns de dois gêneros, mandando que sua variação se dê pela simples alteração do artigo (o oficial e a oficial).[21]
16) Em outra passagem, o mesmo autor obtempera que “melhor é a forma oficial tanto no masculino como no feminino”, justificando que na linguagem culta são muitos os substantivos com essa terminação que “variam no gênero com a simples mudança do artigo e do adjetivo que os modifiquem”.
17) Acrescenta ele que adjetivos dessa natureza – de segunda classe – em latim, tinham uma mesma forma para o masculino e para o feminino, e, ao se formar o substantivo de tal adjetivo, “surgia um substantivo masculino ou feminino, conforme fosse masculino ou feminino o substantivo suprimido no ato da substantivação”.
18) E conclui que “o mesmo processo perdurou no português”, razão pela qual “também é melhor solução falar o oficial de justiça e, em se tratando de mulher, a oficial de justiça”, sendo oficiala uma “solução inferior”.[22]
19) Por fim, é interessante anotar que, diferentemente de coronela, generala, marechala e sargenta, não registra o feminino oficiala o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras (VOLP/ABL), que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da existência ou não de vocábulos em nosso idioma; deixa, contudo, o assunto sem solução, porque registra oficial apenas como masculino (e não comum-de-dois gêneros), sem se manifestar acerca da forma feminina que se há de usar.[23]
20) Ora, se não é comum-de-dois gêneros, seu feminino não pode ser a oficial, de modo que se há de cair na regra comum de flexão de gênero, formando-se, de modo correto, a oficiala.
Como se percebe, não há pacificação entre os gramáticos acerca do uso do adjunto “[a] oficial” (artigo antes do substantivo, que permanece sem flexão); ou da expressão “oficiala” (substantivo flexionado de acordo com o gênero feminino).
Vale lembrar que quando as profissões possuem designação que utiliza como última letra o artigo “o”, como regra geral, não há dúvidas de que o substantivo deve ser flexionado para o gênero feminino (Ex: notário e notária, empregado doméstico e empregada doméstica, jornaleiro e jornaleira, mecânico e mecânica, enfermeiro e enfermeira, médico e médica, advogado e advogada, secretário e secretária etc.).[24]
Há casos, no entanto, de profissões que terminam com o artigo “a” e são comuns-de-dois-gêneros, masculino e feminino (Ex: motorista, diplomata, dentista, jornalista, analista, balconista, cientista, fisioterapeuta, oculista, atleta, artista, cinegrafista, roteirista, sonoplasta, radiologista etc.).
Em geral, as profissões que terminam com as letras “or” são flexionadas quando do gênero feminino (Ex: registrador e registradora, promotor e promotora, governador e governadora, professor e professora, embaixador e embaixadora ou embaixatriz, narrador e narradora, agricultor e agricultora, programador e programadora, animador e animadora, produtor e produtora etc.)
Também são flexionadas as palavras que se referem a profissões do sexo masculino que terminam com as letras “ão” (Ex: tabelião e tabeliã, escrivão e escrivã, capitão e capitã, cirurgião e cirurgiã, artesão e artesã, espião e espiã, tecelão e tecelã etc.).
Diversas palavras que dão nome a profissões que terminam com a letra “l”, ao que parece, em nosso vernáculo, podem ser utilizadas como comum-de-dois-gêneros, sendo o caso de “Oficial” (o Oficial ou a Oficial), que pode ou não ser flexionada. São exemplo, inclusive, no oficialato militar, os postos de coronel/coronela e marechal/marechala, sendo mais comum, inclusive, em razão da melhor fonética (por soar melhor ao ouvido), dizer a coronel e a marechal. Em nosso sentir, algo parecido ocorre com a oficial, que, smj., tem melhor eufonia em relação ao adjunto adnominal “a oficiala”.
No que tange à palavra “oficial” (designativa de profissão), ademais, o próprio VOLP (dicionário da Academia Brasileira de Letras, que atualiza e faz o registro oficial das palavras da Língua Portuguesa, com especial atenção a sua vertente brasileira) não fornece uma resposta conclusiva sobre o uso do termo “oficial(a)”: por um lado porque não prevê o vocábulo “oficiala” dentre seus verbetes, por outro, porque não estabelece que “oficial” é substantivo comum-de-dois-gêneros.
Assim sendo, não parece errado o uso da expressão “Oficiala”, embora também não seria incorreto usar o adjunto “a Oficial”. Assim, enquanto não houver definição pela ABL, é correto dizer ou escrever tanto “a Oficial de Registro” como “a Oficiala de Registro”, sendo que compete ao falante ou escritor utilizar o vocábulo que melhor lhe agrada foneticamente.
Embora não tenha sido solicitada minha opinião: eu, particularmente, prefiro muito mais utilizar tanto para o gênero masculino como para o feminino apenas a designação “OFICIAL” (“o Oficial” ou “a Oficial”). É dizer: “Oficiala” é feio… mas se quiser, pode usar. Por sua conta e risco!
E assim, fechamos a segunda parte de nossa série Nomenclaturas Notariais e Registrais. No próximo capítulo, trataremos sobre as nomenclaturas adotadas pela lei e também pelos usos e costumes cartorários em relação às diversas especialidades de cartórios: Tabelionato de Notas (TN), Tabelionato de Protesto (TP), Registro de Imóveis (RI), Registro de Títulos e Documentos (RTD), Registro Civil das Pessoas Jurídicas (RCPJ) e Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN).
___________
[1] Dica: Não existe “Oficial Registrador”. Ou é “Registrador”, ou é “Oficial de Registro”!
[2] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 247, grifo nosso.
[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 77, grifo nosso.
[4] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 197-198, grifo nosso.
[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 290, grifo nosso.
[6] No sistema brasileiro, em que pese serviços de naturezas bastante diferentes, parece que a profissão que mais se assemelha com a forma de ingresso na atividade pelos Notários e Registradores é a função de Prático Naval. Este profissional fornece um serviço de auxílio aos navegantes, estando disponível geralmente em áreas que apresentam dificuldades ao tráfego de embarcações, principalmente para as de grande porte. O ingresso na referida carreira (a praticagem de navios) também depende de concurso público e é exercida em caráter privado, recebendo uma “delegação” ou “habilitação” estatal. O Prático realiza concurso público multidisciplinar promovido pela Marinha do Brasil. Contudo, diferentemente da atividade notarial e registral, a legislação não reconhece que este profissional é detentor de uma função pública, a despeito de o serviço por ele realizado ser público. Por curiosidade, os serviços de praticagem naval são regulamentados pelos arts. 12 a 15 da Lei nº 9.537, de 1997.
[7] ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 31. ed. São Paulo: Método, 2021.
[8] O Código de Normas do Estado do Paraná, ao invés de utilizar os nomes previstos em lei, no art. 3º do Estatuto dos Notários e Registradores (Lei nº 8.935/1994), utiliza indiscriminadamente a expressão “agentes delegados”. Além disso, denomina o concurso público de “concurso de agente delegado”.
[9] Alguns Estados tem abandonado essas nomenclaturas, padronizando os cargos de nível superior da Justiça Comum Estadual como Analista Judiciário, podendo ser nomeado pelo juízo, como secretário judicial ou chefe de secretaria (mesma função de escrivão judicial), da mesma forma como são chamados na Justiça Federal e nas Justiças Especiais.
[10] No âmbito da Polícia Civil, também existe o cargo de Escrivão de Polícia, que não guarda nenhuma relação, por óbvio, com a função notarial e registral.
[11] COSTA, José Maria da. Oficial. Gramaticalhas. 06 dez. 2006. Atual. 03 jan. 2023. Disponível em: Acesso em: 11 abr. 2023, grifo do autor.
[12] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 1. ed., 8. reimpressão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. p. 992.
[13] ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de questões vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 215.
[14] BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 19. ed., 2ª reimpressão. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1974. p. 84.
[15] CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de dificuldades da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 294.
[16] OLIVEIRA, Cândido de. Revisão gramatical. 10. ed. São Paulo: Luzir, 1961. p. 133.
[17] BUENO, Francisco da Silveira. Questões de português. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1957, p. 382-383.
[18] TORRES, Artur de Almeida. Moderna gramática expositiva. 18. ed. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1966, p. 59.
[19] JUCÁ FILHO, Cândido. Dicionário escolar das dificuldades da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Fundação Nacional de Material Escolar (Fename), 1963, p. 452.
[20] OLIVEIRA, Édison de. Todo o mundo tem dúvida, inclusive você. Porto Alegre: Gráfica e Editora do Professor Gaúcho Ltda., edição sem data, p. 158.
[21] ARRUDA, Geraldo Amaral. A linguagem do juiz. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 36-37.
[22] ARRUDA, Geraldo Amaral. A linguagem do juiz. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 145-146.
[23] Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 2. ed., reimpressão de 1998. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1999, p. 199, 366, 477, 536 e 672.
[24] Interessante questão gramatical é a utilização da palavra “Presidente” flexionada para o feminino. Como a última letra da palavra presidente é a letra “e” (e não “o”), é possível utilizar o verbete para os dois gêneros, masculino e feminino (o presidente ou a presidente). Não existe, por exemplo, o adjunto “o presidento”. Desse modo, seguindo a mesma lógica, em tese, não haveria porque flexionar a palavra para o feminino. Não obstante, nosso léxico considera o verbete “presidenta” uma palavra grafada corretamente, sem prejuízo de que se utilize a presidente (substantivo comum-de-dois-gêneros). A flexão da palavra para o feminino de presidente é atestada desde pelo menos 1899 pelo Dicionário de Cândido de Figueiredo, ano de sua 1ª edição. O uso da grafia presidenta, aliás, foi bastante difundido no período de gestão de Dilma Rousseff, bastando ao leitor acessar o site do Planalto e ver que todas as leis e demais atos normativos sempre a designaram como a Presidenta da República. A utilização do vocábulo, embora correta, é, no mínimo, curiosa, vez que outras profissões com igual sufixo (-te), as palavras não são flexionadas, a exemplo de gerente, dirigente, superintendente, escrevente, docente, tenente, comandante, agente, ajudante, assistente, servente, engraxate, sacerdote, ambulante, comerciante, feirante, interprete, anunciante, comediante, etc.
Fonte: Migalhas
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